ASSINE NOSSA NEWSLETTER


cultura

Um elogio ao Japão

De Wabi sabi a Issey Miyake: as pontes que o país oriental usa para se conectar com o mundo

Por Caroline Carvalho

17 de Outubro de 2022

Origami. Biombo. Samurai. Fonte de água. Bonsai. Vermelho. Gueixa. Kimono. Kung Fu. Buda. Zen Budismo. Yakisoba. Sushi. Nissin. Yaoy Kusama. Tomie Otake. Issey Miyake. Wabi sabi.

Um mundo do oriente veio mesmo para mexer com a gente. Mas, entre a cultura moderna e a tradicional, há uma ponte. Simbólica ou não. Em se tratando de Japão, essa construção parece cumprir mais do que sua função de conectar fisicamente.

Geograficamente e politicamente isolado em seu arquipélago, é na era Meije (1868 - 1912), quando o Japão começa seus processos de modernização e possibilita a construção de uma ponte cultural. Graças à fotografia e à xilogravura, nos chega um universo imagético e um repertório vai sendo construído no nosso imaginário.

Meu interesse (e acredito não estar sozinha) a cerca da cultura japonesa, ultimamente está ligado ao wabi sabi, essa tendência que anda influenciando o design e a arquitetura. Ela se tornou meu ponto de partida na busca de compreender um pouco mais desse efeito Japão que há muito importamos. A introdução foi a leitura de "Wabi-sabi para artistas, designers, poetas e filósofos" de Leonard Koren.

Meses depois, chegou à caixa de e-mail a divulgação de um curso sobre rituais japoneses e não hesitei em me inscrever. Na primeira aula lá estava a imigrante japonesa Mami Goda com sua voz tranqüila, que os mais dez anos de vida na Argentina não lhe tiraram. Mami falou da permanência das coisas e usou as cerâmicas como exemplo dessa quase utopia. 

Mami nos conta que em 2011, após o Grande Terremoto de Tohoku, uma escola de cerâmica reuniu professores e alunos para produzir conjuntos de recipientes para enviar às pessoas que estavam vivendo em moradias temporárias. O kit continha o considerado básico para o momento essencial de alimentar-se: pratos e bows. Peças em plásticos talvez fosse a escolha imediata (e econômica) feita por um ocidental, algum participante do curso contesta. Não no Japão ou naquela situação.

Para compreender sobre a passagem mais lenta do tempo, Mami Goda citou o livro "elogio da sombra". Li a versão em espanhol de Junichiro Tanizaki. Aqui é a escrita detalhada que nos convida a conhecer o que se valoriza no Japão daqueles idos. Somos conduzidos a um caminho em que a beleza está onde há sombras, nos lugares que o tempo tem espaço para ser. 

Encontrei como resposta ao wabi sabi esse convite para ver a beleza do efeito do tempo. Nas coisas, nos objetos, nos nossos corpos, ele está aqui. Imperfeito, em transição, impermanente. 

Mas há um Japão mais cool também. Entre a inovação e a tradição, penso no fazer moda de Issey Miyaki que olhou para o origami (a técnica de dobradura em papel) para pensar no plissado tecnológico dos anos 80. A técnica ficou conhecida como pleats, please (plissados, por favor), e preenche um capítulo importante para contar a história da moda. Visionário, Miyaki foi um dos primeiros estilistas a estar em Paris e apresentar a sua moda habitável e em movimento. 

Outro dia alguém compartilhou um episódio do podcast High Low sobre Rei Kaakubo, Yohji Yamamoto, Issey Miyake e a revolução japonesa no mundo da moda. Isabel Junqueira e Olivia Merquior, usando a estética como fio condutor, comentam sobre os feitos desses nomes relevantes da moda japonesa. Mesmo no esforço de romper com o incômodo que o tradicional podia exercer, lá estava a sombra, o lugar de dor atravessado. Guerras, bomba atômica, políticas tradicionais, tecidos em tramas.

Sobre a ponte, foi no curso-poesia "tempos e espaços na arquitetura japonesa" de Marina Lacerda, que entendi (ou estou nesse processo) a necessidade de espaços vazios para o kami, o sagrado.  As pontes, os portais, a parte não pintada da tela: vãos livres para o que é divino se expressar. "O vazio, distinto de uma concepção ocidental cujo significado é o nada, é visto como algo do nível da potencialidade, que tudo pode conter, e, portanto, da possibilidade de geração do novo", explica Michiko Okano. Há beleza nesse convite a dar espaço. O novo já pode chegar.

Por Caroline Carvalho

Contadora de histórias por meio de joias (@carolajoias), aulas-tours (@vamos_modar) e, por aqui, palavras. Os afetos presentes na arte, na arquitetura e no design muito lhe interessam.


Logo escrito iLovee em tom preto único

ASSINE NOSSA NEWSLETTER