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O efeito "Drive My Car"
Adaptado de contos de Murakami, "Drive My Car" é uma jornada metalinguística pelas dores humanas
20 de Fevereiro de 2023

Hoje eu quero falar de "Drive My Car". Não, não é a primeira vez que escrevo sobre esse filme, mas ainda não tinha escrito após revê-lo. Essa foi minha quarta rodada de "Drive My Car" - e, provavelmente, não será a última. O denso longa-metragem de três horas é baseado em contos de Haruki Murakami. Não é das obras mais fáceis de sentar e deixar que seu corpo seja transportado para dentro da tela. No entanto, vale cada minuto.

O filme japonês, ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2022 e diversos outros prêmios, foi dirigido por Ryusuke Hamaguchi. A primeira vez que assisti, foi a trabalho e me senti sozinha na sala de cinema de tão imersa. Na segunda vez, eu vi ao lado de um conhecido que eu não tinha intimidade, então me senti muito invadida, queria que fosse com uma pessoa mais próxima. Na terceira assistida foi diferente de tudo, pois estava finalmente com alguém que eu julgava ser especial e foi muito significativo. Eu chorei em todas as sessões e, ao mesmo tempo, que me sentia triste, também me sentia muito completa.
Eu não sei explicar o efeito de "Drive My Car" em minha mente. Desta última vez, eu estava me sentindo vazia e antes sequer de terminar a primeira fala do filme, eu já tinha desabado em lágrimas. Inclusive, um dos diálogos da narrativa é um personagem dizendo que se sente vazio. De certa forma, eu quis revê-lo justamente por isso. Eu não me lembrava mais desta sensação.
É um filme sobre a vida, arrependimentos, luto e, principalmente, sobre nós mesmos e como negligenciamos nossos pensamentos para evitar conflitos com as outras pessoas. É sobre quem somos, seres complexos demais e, talvez, egoístas na mesma medida. No entanto, o amor consegue nos fazer retrair certos sentimentos.
Para situar um pouco da história, "Drive My Car" gira em torno de um ator viúvo, Yusuke (Hidetoshi Nishijima), que vai para Hiroshima dirigir a adaptação de uma peça - uma montagem de Tio Vânia, de Tchekhov. Lá ele conhece a motorista Misaki (Tôko Miura) e juntos, eles passam a confrontar e superar os demônios do passado.

Contando assim por cima, parece uma narrativa bem genérica, mas não é. O filme junta contos do livro "Homens Sem Mulheres", do Murakami, em um roteiro metalinguístico ridiculamente bem feito. É um longa de três horas que precisa ter essa duração, sem tirar nem pôr. Não consigo achar um defeito, talvez seja triste que tenha um filme, mas paciência, tudo que é bom dura pouco.
Não vou citar quesitos técnicos e nem culturais do longa, não é o foco aqui. Meu objetivo, na verdade, é divagar um pouco sobre o poder que o cinema tem despertar um turbilhão de emoções em nossa mente - e como isso muda de pessoa para pessoa. Pode ser que você assista "Drive My Car "e não sinta absolutamente nada. Eu sinto tudo, cada desgosto, cada término, cada luto e cada insatisfação. É como se eu precisasse de alguma clareza que só a imersão deste filme consegue trazer. Eu li o livro em que o longa foi baseado, por mais que tenha gostado, a adaptação cinematográfica tem um peso diferente.
Caso você queira descobrir o efeito "Drive My Car", a produção está disponível no streaming da Mubi.